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12 novembro 2010

Educação em saúde como estratégia de promoção de saúde bucal em gestantes

Ciência & Saúde Coletiva
version ISSN 1413-8123
Ciênc. saúde coletiva vol.15 no.1 Rio de Janeiro Jan. 2010
doi: 10.1590/S1413-81232010000100032

TEMAS LIVRES FREE THEMES



Educação em saúde como estratégia de promoção de saúde bucal em gestantes



Health education as a strategy for the promotion of oral health in the pregnancy period





Deise Moreira ReisI; Daniela Rocha PittaI; Helena Maria Barbosa FerreiraI; Maria Cristina Pinto de JesusI; Mari Eli Leonelli de MoraesII; Milton Gonçalves SoaresII

IFaculdade de Odontologia, Universidade Federal de Juiz de Fora. Rua José Lourenço Kelmer s/n, Bairro São Pedro. 36036-330 Juiz de Fora MG. blaudeise@hotmail.com
IIFaculdade de Odontologia de São José dos Campos, Universidade Estadual de São Paulo





RESUMO

O objetivo desta revisão da literatura é discutir a importância da educação em saúde como estratégia de promoção de saúde bucal no período gestacional. Foram estudadas as manifestações bucais mais comuns na gestação, concluindo-se que, embora a gestação por si só não seja responsável por tais manifestações como, por exemplo, a cárie dentária e a doença periodontal, faz-se necessário o acompanhamento odontológico no pré-natal, considerando-se que as alterações hormonais da gravidez poderão agravar as afecções já instaladas. Destacou-se na promoção de saúde bucal na gestante a educação em saúde bucal, considerando-a parte importante do Programa de Atenção à Saúde da Mulher, conforme recomendado pelas atuais Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. Considera-se que, por meio de ações de educação em saúde bucal, desenvolvidas no pré-natal por uma equipe multiprofissional, orientada por um cirurgião-dentista, a mulher poderá se conscientizar da importância de seu papel na aquisição e manutenção de hábitos positivos de saúde bucal no meio familiar e atuar como agente multiplicador de informações preventivas e de promoção de saúde bucal.

Palavras-chave: Promoção da saúde bucal, Educação em Saúde, Saúde bucal da gestante

ABSTRACT

This literature revision is intended to discuss the importance of health education as a strategy to oral health promotion in the pregnancy period. The most common mouth manifestations during pregnancy have been studied, and the conclusion is that, although pregnancy itself is not responsible for such manifestations in the mouth, e.g. dental decay and periodontal diseases, a dentistry follow-up during prenatal care is necessary, considering that hormonal alterations in pregnancy may aggravate the diseases contracted. The oral health promotion for pregnant women has been focused on mouth health education, considering it an important part of the Program of Attention to Women's Health, as recommended by the current National Politics' Mouth Health Policy. It is considered that, by means of mouth health education activities, implemented during prenatal care by a multiprofessional team, under an oral surgeon, women may be aware of the importance of their role in the attainment and maintenance of positive mouth health habits in family environment and act as an agent to multiply preventive and mouth-health-promotion information.

Key words: Oral health promotion, Health education, Pregnant's oral health





Introdução

O conceito de saúde não se limita à ausência de doença ou enfermidade, mas deve ser entendido como um conjunto de elementos que proporcionem o bem-estar físico, mental e social, conforme apontado pela Organização Mundial de Saúde.

Inserida em um conceito amplo de saúde, a promoção da saúde bucal transcende a dimensão técnica da prática odontológica, sendo a saúde bucal integrada às demais práticas de saúde coletiva. As ações de promoção e proteção à saúde visam à redução de fatores de risco, que constituem uma ameaça à saúde das pessoas, podendo provocar-lhes incapacidade e doenças1.

O Relatório da I Conferência Nacional de Saúde Bucal, realizada em 1986, enfatiza a saúde bucal como parte integrante e inseparável da saúde geral do indivíduo, estando ela diretamente relacionada com as condições de alimentação, moradia, trabalho, renda, meio ambiente, transporte, lazer, liberdade, acesso à terra e posse dela, acesso aos serviços de saúde e à informação2.

Na prática, podemos constatar que, a despeito das atuais políticas de saúde bucal vigentes, ainda não existe um atendimento odontológico pré-natal integral como sugere a promoção de saúde. Crenças e mitos de que o tratamento odontológico realizado durante a gravidez prejudica o desenvolvimento do filho ainda acompanham mulheres gestantes e contribuem para dificultar o cuidado com a saúde bucal neste período. Por outro lado, tem-se que considerar que ainda há dificuldades de acesso da população ao profissional, tanto na esfera particular como pública.

A gestante deve ser atendida sempre que, espontaneamente, procure assistência. Entretanto, torna-se necessário desenvolver atividades profissionais incentivando-as através de um esclarecimento mais amplo sobre a possibilidade de tratamento e o significado dos quadros crônicos enquanto fatores de agravos à saúde bucal durante a gestação3.

A gestação é o momento no qual a mulher se mostra receptiva às mudanças e ao processamento de informações que possam ser revertidas em benefício do bebê. Assim, as atitudes e escolhas maternas certamente refletirão no desenvolvimento e nascimento de um bebê saudável. A mulher tem o papel-chave dentro da família, zelando pela sua saúde e de seus entes, tornando-se multiplicadora de informações e ações que possam levar ao bem-estar do núcleo familiar e consequentemente à melhora da qualidade de vida. A aquisição de hábitos e escolhas saudáveis implica diretamente a mudança de comportamento, levando à promoção e manutenção de saúde do indivíduo.

Neste sentido, ações educativas e preventivas com gestantes tornam-se fundamentais para que a mãe cuide de sua saúde bucal e possa introduzir bons hábitos desde o início da vida da criança. É fundamental ressaltar que esforços combinados da equipe de saúde são importantes para obtenção do sucesso de tais ações.

Qual a importância da educação em saúde na promoção da saúde bucal no período gestacional? Esta indagação norteou o presente estudo.



Educação em saúde bucal na gestação

Manifestações bucais na gestação

Aspectos fisiológicos da gravidez

A hipersecreção das glândulas salivares, a tendência ao vômito e a maior vascularização do periodonto são alterações gerais e específicas de interesse na área odontológica que ocorrem no período gestacional4.

O período da gravidez constitui um momento de transformações na vida da mulher, pois, além das alterações físicas e fisiológicas, são observadas também mudanças no estado emocional. Neste período, desenvolvem-se certas condições de saúde complexas que precisam ser conhecidas pelo cirurgião-dentista, a fim de que, como membro de uma equipe-multidisciplinar, possa orientar corretamente a gestante em relação a seu estado de saúde geral5.

Várias são as alterações que ocorrem nos sistemas orgânicos da gestante, a saber: em relação ao aparelho circulatório, evidencia-se um aumento da pressão arterial de aproximadamente 33% entre a 25ª e 36ª semana de gestação. Essa alteração pode vir correlacionada com taquicardia e um murmúrio sistólico (cerca de 70% das pacientes grávidas), sendo esta uma condição natural e funcional. Já o sistema respiratório passa por mudanças fisiológicas e estruturais. Fisiologicamente, há um aumento no consumo de oxigênio em torno de 15% a 20%. A capacidade de reserva funcional diminui por causa da compressão do diafragma pelo útero gravídico, aumentando o risco de apnéia ou dispnéia em posição supina. Além disso, o útero gravídico, no terceiro trimestre, causará compressão da veia cava e artéria aorta, aumentando a probabilidade de hipotensão postural quando em posição supina. Outras alterações ocorrem, como a hipoglicemia, o ganho de peso e a frequente necessidade de urinar. As náuseas e enjôos, seguidos de vômitos, são também comuns no estado de gravidez5.

Tais manifestações podem ser explicadas pelo desequilíbrio da atividade metabólica ocasionada pela elevação e liberação de taxas hormonais, inclusive a progesterona. Embora na gravidez as alterações hormonais repercutam na fisiologia bucal, modificando o equilíbrio normal da boca, podendo levar à exacerbação do processo carioso e a afecções gengivais, não é o período gestacional o responsável por tais alterações, mas pode agravar inflamação gengival preexistente, principalmente se houver negligência da higiene bucal5.

Afecções periodontais na gravidez

As alterações que ocorrem no periodonto durante a gravidez vêm sendo estudadas desde antes da metade do século XX. Alguns autores6 ressaltaram as modificações do periodonto durante a gravidez como fatores relacionados às "deficiências nutricionais, altos níveis de estrógeno e progesterona, presença de placa bacteriana, muitas vezes, favorecida por outros fatores locais, assim como o estado transitório de imunodepressão".

A nutrição é um aspecto importante a ser considerado para as condições de saúde satisfatórias durante a gestação, visando garantir o desenvolvimento do feto e a proteção do organismo materno. Uma nutrição materna inadequada na última parte da gestação compromete o crescimento fetal e nem sempre as reservas do organismo materno podem proteger o feto das deficiências nutricionais7.

De acordo com o autor8, o estado nutricional da gestante deve ser rigorosamente observado pelo profissional de saúde, ressaltando a necessária oferta de nutrientes ao organismo materno, não só a de proteínas que constituem a base fundamental, mas a de glicídios, lipídios e vitaminas especialmente a vitamina B6, cujos níveis deficientes no soro materno têm sido associados aos índices de Apgar insatisfatório. Também os minerais são considerados nutrientes importantes para o crescimento e o desenvolvimento fetal.

Os microorganismos não colonizam diretamente a superfície mineralizada do dente. Os dentes são sempre cobertos por uma camada protéica acelular denominada película, que se forma sobre a superfície "nua" do dente em minutos a horas. A partir da adesão de células bacterianas, ocorre o crescimento das mesmas, levando à formação de microcolônias distintas (quatro a vinte e quatro horas). Enquanto a placa se desenvolve, a microbiota é cada vez mais complexa. Com o crescimento continuado das microcolônias, ocorre a formação da placa madura (duas semanas ou mais). A placa bacteriana deve ter cerca de dois dias de existência antes da formação de ácido para causar a desmineralização do esmalte. Isso não significa, entretanto, que as pessoas devam deixar de limpar os seus dentes todos os dias. A maioria das pessoas não limpa perfeitamente seus dentes cada vez que os escova e as bactérias que são deixadas sobre os dentes podem contribuir para o crescimento contínuo da placa dental e para a produção de ácido.

De acordo com alguns autores9, a gravidez e os hormônios esteróides específicos parecem capazes de influenciar a microbiota normal e induzir alterações na ecologia subgengival. No segundo trimestre de gestação, ocorre um aumento significante de gengivite, na proporção de bactérias anaeróbias/aeróbias, na correlação entre os níveis plasmáticos de estrógeno e de progesterona e a presença de bacteróides melaninogenicus ss. intermedius. A microbiota subgengival torna-se mais anaeróbia com o progresso da gravidez.

Influência materna e fatores de risco da cárie dentária

A cárie é uma doença de natureza infectocontagiosa, que ocorre devido à interação de uma série de fatores primários (dieta, microorganismos, hospedeiro, tempo); secundários (saliva, flúor, higiene bucal) e terciários (sexo, idade, raça e nível socioeconômico)10.

De acordo com alguns relatos10, a gravidez não é responsável pelo aparecimento de cáries e nem pela perda de minerais dos dentes da mãe, mas o aumento da atividade cariogênica está relacionado com a alteração da dieta e com a presença da placa bacteriana, causada pela limpeza inadequada dos dentes. O aumento de cáries na mulher grávida é provavelmente determinado por possíveis negligências com a higiene bucal; maior exposição do esmalte ao ácido gástrico (vômitos); alterações de hábitos alimentares resultantes do fato de estar grávida; aumento da frequência das refeições (com a compressão do feto, diminui a capacidade volumétrica do estômago e, consequentemente, a gestante alimenta-se em pequenas quantidades, porém mais vezes, incluindo alimentos cariogênicos).

Os autores11 ressaltaram a prevenção da cárie dentária através do controle da dieta, podendo ser desenvolvida desde a vida intra-uterina, especificamente a partir do quarto mês de gestação, "período em que se inicia o paladar do bebê; portanto, a implementação de novos hábitos alimentares da mãe proporcionará uma melhor condição bucal no futuro bebê".

É importante ressaltar que o fluxo salivar aumenta nos primeiros meses da gestação e a hiperatividade das glândulas salivares é um fenômeno, sem causa definida. O excesso de secreção salivar provoca náusea e vômito e, se persistir até o final da gestação, provoca queda da capacidade tampão da saliva fator importante no aumento do risco de desmineralização dental10.



Educação em saúde como estratégia de promoção de saúde bucal em gestantes

Educação em saúde

O termo educação, segundo o autor12, significa "processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral do ser humano".

Em relação à saúde, o pensamento de Freire caminha paralelo à compreensão da questão da educação em saúde pensada nos dias atuais. A educação em saúde vem sendo analisada de modo que o seu significado possa atender aos princípios e valores inovadores do sistema de saúde, dentre outros, o conceito ampliado de saúde e a integralidade da atenção com vistas a possibilitar a atenção integral e humanizada à população brasileira13.

A educação em saúde é definida como: "quaisquer combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a facilitar ações voluntárias conducentes à saúde". Combinação enquanto abordagem dos múltiplos determinantes dos comportamentos humanos, experiências e intervenções; delineadas no sentido de constituírem atividades sistematicamente planejadas e que sejam vivenciadas sem coerção, com plena compreensão dos objetivos implícitos e explícitos nas ações educativas14.

Para alguns autores15, a educação em saúde é um processo que induz à mudança de comportamento relativo à saúde. E esse processo deve ser não somente individual, mas também coletivo, com vistas à promoção de informações e motivação de hábitos que mantenham a saúde e previnam as doenças. Apontaram pontos importantes para a promoção da saúde bucal, entre eles, a motivação e a cooperação consciente do paciente, os programas preventivos, incluindo palestras, escovação dentária supervisionada, controle e avaliação, considerando-se as faixas etárias receptivas, ou, pelo menos, susceptíveis à mudança de hábitos, a adoção de hábitos alimentares adequados e a correta higiene bucal. Além disso, salientaram a fluoretação das águas de abastecimento público, considerada o método de prevenção de cárie dentária mais efetivo, em termos de abrangência coletiva.

A educação em saúde poderá possibilitar ao usuário a mudança de hábitos de saúde, apoiando-o na conquista de sua autonomia, constituindo-se de ações que objetivam a apropriação do conhecimento sobre o processo saúde-doença, incluindo fatores de risco e proteção à saúde bucal1.

A educação em saúde constitui um processo destinado a manter e elevar o nível de saúde da população e, ao mesmo tempo, reforça a manutenção de hábitos positivos de saúde. Educação em saúde pode ser definida como práticas sociais que se estabelecem entre sujeitos (profissionais e usuários) que atuam em instituições de saúde, conscientes ou não da função educativa desenvolvida16 .

Com o objetivo de criar vínculos entre a ação do profissional de saúde e o pensar/fazer cotidiano da população, a educação em saúde visa capacitar indivíduos e/ou grupos para assumir e melhorar suas condições de vida. Assim, esta ação deve ser estimulativa, com vistas a levar o indivíduo a participar do processo educativo; exercitativa, condição para aquisição e formação de hábitos, assim como para a assimilação, construção e reconstrução de experiências; orientadora, com enfoque nos aspectos de liberdade, autoridade, autonomia e independência; didática, que se responsabiliza pela transmissão e veiculação dos conhecimentos e terapêutica para permitir retificar os eventuais descaminhos do processo educativo16.

Considerações sobre a atenção à saúde da mulher

O Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), em 1983, quando foi criado, já previa em suas bases a assistência à mulher, não somente na fase reprodutiva, como vinha acontecendo até então, mas em todos os momentos de sua vida, envolvendo a oferta de ações globalmente dirigidas ao atendimento das necessidades do grupo em questão17.

Este programa reconhece a importância da educação em saúde e afirma que as gestantes constituem o grupo ideal para que o processo de aprendizagem se realize. Com relação à assistência odontológica, especificamente no pré-natal, é salientado que todas as gestantes inscritas deverão ser agendadas para a consulta de rotina nas unidades de saúde que disponham de serviço odontológico. Na consulta de rotina, deverá ser realizado o exame clínico da cavidade bucal e elaborado um plano de tratamento, a ser desenvolvido durante o pré-natal18.

Para enfrentar as dificuldades de implantação das políticas de saúde da mulher, o Ministério da Saúde elaborou, em 2001, a Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS), com o intuito de "ampliar as responsabilidades dos municípios na Atenção Básica, definir o processo de regionalização da assistência, criar mecanismos para o fortalecimento da gestão do SUS e atualizar os critérios de habilitação para os estados e municípios." Esse documento prevê para os municípios a garantia das ações básicas mínimas de pré-natal e puerpério, planejamento familiar e prevenção do câncer do colo uterino e de mama19.

Com relação às ações de saúde bucal, a NOAS prevê como responsabilidade dos municípios a prevenção dos problemas odontológicos e o cadastramento prioritário, na população de zero a catorze anos e gestantes. Entre as atividades, são salientados os procedimentos coletivos, tais como "o levantamento epidemiológico, a escovação supervisionada e evidenciação da placa bacteriana, os bochechos com flúor e a educação em saúde bucal"19.

É importante salientar que a promoção da saúde constitui uma das atribuições comuns aos profissionais de saúde bucal e também é listada como atribuição específica do cirurgião-dentista no Programa Saúde da Família: "coordenar ações coletivas voltadas à promoção e prevenção em saúde bucal, capacitar as equipes de saúde da família no que se refere às ações educativas e preventivas em saúde bucal"19.

Educação em saúde e promoção da saúde bucal na gestação

A educação em saúde bucal é o método mais empregado nos programas de saúde bucal, juntamente com as iniciativas para a fluoretação das águas de abastecimento, a indicação do uso de dentifrícios, bem como a escovação supervisionada e o uso do fio dental, bochechos com solução fluoretada e aplicação tópica de fluoretos19-21.

Ao discutirem a implementação de programas de atenção à saúde materno-infantil, incluindo orientação para gestantes quanto aos cuidados com o bebê, e meios específicos para a redução de Streptococcus mutans, os autores11 apontaram a educação em saúde, por meio da instrução de higiene e orientação da dieta, como um complemento das ações desenvolvidas nos programas de saúde integral.

Os autores22, em seu estudo intitulado "O que as gestantes sabem sobre cárie dentária: uma avaliação dos conhecimentos de primigestas e multigestas quanto à própria saúde bucal", afirmaram que as entrevistadas manifestaram interesse por receberem informações e que, de maneira geral, elas reconhecem a cárie dentária como problema bucal, associando estes problemas especialmente à falta de higiene bucal.

Os autores23 constataram que a maioria das gestantes não tem conhecimento acerca dos prejuízos que podem advir para a saúde bucal da criança quanto ao tempo de amamentação prolongada, uso indevido de mamadeira e o hábito do consumo de açúcar para o preparo dos alimentos do bebê; além dos conhecimentos com relação à higiene bucal pessoal e da criança. Avaliaram longitudinalmente a efetividade da educação durante o pré-natal e concluíram que houve uma conscientização e retenção das informações por parte dos pais em relação às orientações sobre saúde bucal para com o bebê. Assim, sugeriram programas de promoção da saúde bucal continuados após o nascimento do bebê para reforço e motivação com vistas a permanecer a mudança de hábitos frente à saúde.

Os autores24 concluíram em seu estudo que as mães são desinformadas em relação aos cuidados bucais que devem ter com o bebê. Estes autores reafirmam a importância das informações sobre a higiene bucal do futuro filho e que essas informações devem ser dirigidas às mães por profissionais de saúde, em geral, não só o cirurgião-dentista, mas pelo ginecologista, pediatra e pelo obstetra, de modo interdisciplinar, com o objetivo de ampliar o conhecimento delas sobre a gestação, suas implicações gerais e bucais que ocorrem nelas mesmas e no futuro filho. Estudos citados por outros autores5 indicam que é preciso conhecer a percepção das gestantes a respeito da saúde bucal para que um programa de prevenção possa ter sucesso.

A maioria das gestantes relaciona saúde bucal com a saúde geral, mas não procura assistência odontológica durante a gravidez. Hábitos e conhecimentos saudáveis são mais fáceis de se incorporar se ensinados precocemente; por isso, a mãe é um elemento-chave na formação da personalidade, na educação e no desenvolvimento dos bons costumes e hábitos dos filhos25.



Discussão

O período gestacional deve ser alvo de atenção por parte dos profissionais de saúde, com vistas à promoção da saúde bucal e prevenção de doenças que afetam a cavidade bucal5,23,25,26.

Muitos são os fatores que podem propiciar as manifestações de alterações bucais na gestação, destacando-se as alterações hormonais (alto níveis de estrógenos e progesterona) e a presença de placa bacteriana, devido à higienização bucal ineficiente5,6,9,10,27.

Várias são as manifestações de alterações bucais que podem ocorrer na gestação, sendo as mais comuns a cárie dentária e a doença periodontal; porém, a gravidez não é determinante para o seu aparecimento; o que acontece é que processos bucais já iniciados tendem a se agravar5,10,27.

Cerca de 50% das gestantes apresentam alguma hiperplasia gengival, sendo que, em 20% dos casos, ocorre inflamação, podendo aparecer o granuloma piogênico, por volta do terceiro mês de gestação, que desaparece após o parto10.

Em 71,6% das pacientes estudadas, foram encontrados sinais de doença periodontal (gengivite), segundo os critérios de índice de placa e índice gengival e, em 13,3%, foram registradas bolsas periodontais com profundidades de 5, 7, 8 e 9mm. "Algumas apresentam, além do sangramento gengival, ausências dentárias e migrações de alguns elementos, levando à suspeita de periodontite de progressão rápida"27.

A gengivite é a mais comum complicação bucal que pode ocorrer na gravidez, afetando cerca de 100% das mulheres e pode ser identificada a partir do segundo mês de gestação. A maior susceptibilidade se deve, primeiramente, aos altos níveis de progesterona, que levam à maior permeabilidade dos vasos sanguíneos gengivais, tornando a área mais sensível aos irritantes locais. Também devido à presença de certas bactérias associadas ao processo de inflamação gengival e pela presença de irritantes locais oriundos principalmente da placa dental5.

A maioria das enfermidades gengivais que coincide com a gravidez pode ser tratada mediante a eliminação dos fatores locais, procedendo-se à higiene bucal cuidadosa e ao controle periódico pelo cirurgião-dentista, que deverá motivar a gestante para o comportamento preventivo. Em condições normais, mais de 70% das gestantes teriam a totalidade de suas necessidades periodontais atendidas por procedimentos simples como raspagens e instrução de higiene bucal6.

Uma higienização bem feita ajuda no controle das doenças gengivais e diminui o risco da cárie dentária. Assim, a gestante deve ser orientada para escovar os dentes diariamente e após as refeições, utilizando dentifrício fluoretado, bem como sobre o uso do fio dental para prevenção da cárie dentária e remoção da placa bacteriana interproximais5. A gestante, quando bem informada, poderá ser um elemento-chave na quebra da transmissibilidade da cárie dentária25.

Apoiados em estudos científicos, os autores28 apontaram a associação de mediadores da inflamação da doença periodontal com a diminuição do peso de crianças ao nascer e salientaram que isto se dá quando o periodonto infectado produz mediadores que vão para a circulação sistêmica e, eventualmente, podem atravessar a barreira corioaminiônica, aparecendo no fluido amniótico. Ao atingirem precocemente os níveis encontrados na época do parto normal, inicia-se prematuramente o trabalho de parto. Também podem ser encontrados microorganismos bucais no fluido amniótico, devido à rota ascendente dos microorganismos pelo contato gênito-oral, na qual a microflora se dissemina pelo sangue.

No entanto, em estudo mais recente, os autores9 ressaltaram que, quanto mais severa a doença periodontal, maior é o risco de ocorrer o parto prematuro e que o tratamento dessa doença leva a uma diminuição do percentual de partos prematuros. Caracterizaram a doença periodontal como fator de risco, reafirmando a relação de causalidade entre a doença periodontal e o nascimento prematuro e baixo peso ao nascer.

É importante tratar prontamente as alterações periodontais de mulheres em idade de procriação com vistas à redução da incidência de bebês prematuros e de baixo peso27. Apesar disso, a educação em saúde no pré-natal ainda não constitui uma prática multiprofissional rotineira24.

Esta afirmativa é corroborada pelos autores23, ao avaliarem o atendimento odontológico para gestantes nos serviços públicos de Porto Alegre. Verificaram que, somente em 24,4% dos postos de saúde, todas as gestantes eram atendidas rotineiramente e, em apenas 29% deles, existia ou estava em implantação o acompanhamento odontológico da mãe e do bebê pós-natal.

A abordagem atual das ações odontológicas fundamentadas na Promoção da Saúde Bucal busca o tratamento integral do indivíduo, baseado principalmente em ações educativo-preventivas1,23.

Em uma abordagem social, a educação em saúde, combinando a análise da realidade das gestantes, incentivando sua participação através de metodologias ativas de aprendizagem, que valorizem a liberdade e trabalhem a autonomia das participantes, poderá motivá-las para a aquisição e manutenção de hábitos positivos de saúde15,16.



Conclusão

A partir do objetivo de discutir a importância da educação em saúde como estratégia de promoção da saúde bucal no período gestacional, apontamos algumas considerações.

Embora a gestação por si só não seja responsável pelo aparecimento da cárie dentária, doença periodontal e outras manifestações bucais, faz-se necessário o acompanhamento odontológico no pré-natal com vistas à identificação de riscos à saúde bucal, à necessidade do tratamento curativo e à realização de ações de natureza educativo-preventivas.

As ações de saúde bucal, e em especial a educação em saúde, deverão ser incluídas transversalmente no Programa de Atenção à Saúde da Mulher, em especial o grupo de gestantes, conforme recomendado pelas atuais Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal.

A partir do trabalho de educação em saúde, desenvolvido pelos profissionais de saúde no pré-natal, a mulher poderá atuar como agente multiplicador de informações preventivas e de promoção da saúde bucal se bem informada e conscientizada sobre a importância de seu papel na aquisição e manutenção de hábitos positivos de saúde no meio familiar. Informações relevantes sobre a atenção à saúde bucal em gestantes apontam a educação em saúde como estratégia da promoção da saúde bucal.

É importante que as pessoas sejam informadas sobre as causas e consequências das doenças para que possam delas se prevenir, uma vez que a prevenção primária, sem dúvida, possui um grande potencial no controle e na redução das doenças bucais. É preciso que os pais tenham consciência de que a melhor maneira de educar seus filhos é pela imitação e de que educar é dar exemplo de hábitos saudáveis. Nenhum especialista pode fazer pela criança o que os pais podem fazer.



Colaboradores

DM Reis, DR Pitta, HMB Ferreira, MCP Jesus, MEL Moraes e MG Soares participaram igualmente de todas as etapas da elaboração do artigo.



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Artigo apresentado em 07/11/2006
Aprovado em 25/06/2007
Versão final apresentada em 24/07/2007


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