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28 março 2012

Diagnóstico diferencial de hemangioma por meio da vitropressão

RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 no.1 Porto Alegre jan./mar. 2011

 

CLÍNICO CLINICAL



Differential diagnosis of hemangioma by diascopy


Fernando Luiz Goulart CruzI,*; Rodrigo Furtado de CarvalhoI; Matheus Furtado de CarvalhoI; Lígia de Araújo Ramos SalesII; Karina Lopes DevitoII
IUniversidade Federal de Juiz de Fora, Faculdade de Odontologia. Rua José Lourenço Kelmer, s/n, Campus Universitário, São Pedro, 36036-900, Juiz de Fora, MG, Brasil
IIUniversidade Federal de Juiz de Fora, Faculdade de Odontologia, Departamento de Clínica Odontológica. Juiz de Fora, MG, Brasil






RESUMO
O hemangioma é uma neoplasia benigna ou um hamartoma, cuja principal característica é a proliferação de vasos sanguíneos. Sua etiologia está ligada a anomalias congênitas, traumas físicos, estímulos endócrinos e inflamatórios de etiologia desconhecida. A principal queixa dos pacientes portadores de hemangiomas é o distúrbio estético. Dependendo do tamanho e da localização, podem ocasionar assimetria facial ou interferir na função dos órgãos envolvidos. Quando localizadas no assoalho da boca, essas lesões causam problemas funcionais, associados à mastigação, deglutição e fala. Os hemangiomas devem ser distinguidos das mucoceles, das manchas e malformações vasculares e de outros tumores vasculares da infância. Diante desta informação, o diagnóstico diferencial pode ser estabelecido de forma simples e segura pela anamnese, exame clínico, e por manobras semiotécnicas, como a vitropressão. À compressão pela lâmina de vidro, a lesão adquire coloração pálida, diminuindo de tamanho devido ao esvaziamento vascular. A realização de biópsia incisional não está indicada nestes casos, devido ao risco de hemorragias. Seu tratamento é um tema muito discutido na literatura, desde a proservação, radioterapia, eletrocoagulação, aplicação de laser, crioterapia, cirurgia, escleroterapia até administração de Interferon. O objetivo deste trabalho é apresentar o relato de um caso clínico de um paciente portador dessa neoplasia na mucosa jugal.
Termos de indexação: Diagnóstico. Hemangioma. Neoplasia.

ABSTRACT
Hemangioma is a benign neoplasm or hamartoma whose main characteristic is blood vessel proliferation. Its etiology is related to congenital anomalies, physical trauma and endocrine and inflammatory stimuli of unknown etiology. The main complaint of patients with hemangiomas is their unsightliness. Depending on their size and location, they can cause facial asymmetry or affect organ function. When they are located on the floor of the mouth, these lesions cause functional mastication, deglutition and speech problems. Hemangiomas need to be distinguished from mucoceles, vascular stains and malformations and other childhood vascular tumors. This information allows the differential diagnosis to be established in a simple and safe manner by medical history, clinical examination and simple tests, such as diascopy. When the lesion is pressed with a glass slide, it blanches and shrinks because the blood in the lesion is pushed out. Incisional biopsies are not indicated because of the risk of bleeding. Treatments for hemangiomas are extensively discussed in the literature and include radiotherapy, electrocoagulation therapy, laser therapy, cryotherapy, surgery, sclerotherapy, interferon therapy and follow-up. This paper presents the clinical case of a patient with buccal hemangioma.
Indexing terms: Diagnosis. Hemangioma. Neoplasm.



INTRODUÇÃO
O hemangioma é considerado pela Organização Mundial de Saúde como neoplasia benigna vascular, cuja principal característica é a proliferação de vasos sanguíneos1-4. No entanto, por aparecer como uma anomalia de desenvolvimento, também é classificada como hamartoma, já que está presente, na maioria dos casos, ao nascimento ou nos primeiros anos de vida1-5.
Sua etiologia está ligada a anomalias congênitas, traumas físicos, estímulos endócrinos e inflamatórios de etiologia desconhecida6-7.
Chinen et al.8 realizaram um levantamento de 8.505 fichas de pacientes atendidos no período de janeiro de 1972 a dezembro de 1990, no Serviço de Estomatologia do Hospital Heliópolis (Heliópolis, São Paulo), no qual foram registrados 235 casos de hemangiomas (2,76%). Foi relatada maior prevalência no sexo feminino com maior ocorrência no lábio e seu tempo de evolução próximo de um ano.
Sem predileção por raça, apresenta-se como mancha ou nódulo arroxeado, cuja coloração varia de vermelho intenso ao roxo, de acordo com a localização e a profundidade no tecido, além do grau de congestão do mesmo3.
O tamanho é variável dependendo de diversos fatores que incluem, entre outros, idade do paciente e local da lesão. Em geral, é relativamente flácido à palpação, podendo ser circunscrito ou difuso apresentando-se plano ou elevado, com superfície lisa ou nodular e, na maioria das vezes, assintomático9.
Não é uma lesão exclusiva da boca, podendo desenvolver em qualquer parte do organismo. Mais de 50% dos hemangiomas ocorrem na região de cabeça e pescoço10-11 sendo que na boca ocorrem principalmente nos lábios1,3,12, na língua3,13, na mucosa jugal1,3,14 e no palato1.
Na maxila ou na mandíbula, ocorrem, ocasionalmente, hemangiomas centrais (intraósseos), que se apresentam com aspecto radiolúcido, uni ou multilocular, semelhante a alguns cistos15-16. Nesses casos, pode-se ter dificuldade na realização do diagnóstico diferencial2.
Histologicamente é formado por inúmeros capilares pequenos revestidos por uma camada única de células endoteliais sustentadas por tecido conjuntivo9.
A sua classificação se divide em hemangioma capilar, juvenil, cavernoso e arteriovenoso. O hemangioma capilar é o tipo mais comum, sendo mais frequente no sexo feminino. É observado ao nascimento e prolifera-se rapidamente. O hemangioma juvenil refere-se ao estado imaturo de um hemangioma capilar, sendo comum na região parotídea. O hemangioma cavernoso possui este nome devido ao grande diâmetro dos vasos sanguíneos proliferantes, mostrando características clínicas semelhantes ao hemangioma capilar, incluindo a ocorrência na infância e a preferência pelo sexo feminino e pela região da cabeça e do pescoço4,9,17. Segundo Regezi & Sciubba3 não há diferença clínica significativa entre os hemangiomas capilares e cavernosos. Já os hemangiomas arteriovenosos são malformações vasculares causadas por uma comunicação anormal entre a circulação arterial e venosa4.
A principal queixa dos pacientes portadores de hemangiomas é o distúrbio estético. Dependendo do tamanho e da localização, podem ocasionar assimetria facial ou interferir na função dos órgãos envolvidos. Quando localizados no assoalho da boca, essas lesões causam problemas funcionais, associados à mastigação, deglutição e fala18.
Os hemangiomas devem ser distinguidos das mucoceles, das manchas vasculares, das malformações vasculares e de outros tumores vasculares da infância19-20. Diante desta informação, o diagnóstico pode ser estabelecido de forma simples e segura pela anamnese, exame clínico, e por manobras semiotécnicas, como a vitropressão, que são conclusivas na maioria dos casos14. Por se tratar de uma lesão vascular, a realização de biópsia incisional não está indicada nestes casos, devido ao risco de hemorragias15.
A vitropressão é importante auxiliar no estabelecimento do diagnóstico diferencial. À compressão pela lâmina de vidro, o hemangioma adquire coloração pálida, diminuindo de tamanho devido ao esvaziamento vascular9.
O tratamento de hemangiomas é um tema muito discutido na literatura, incluindo desde a proservação, radioterapia, eletrocoagulação, aplicação de laser, crioterapia, embolização, cirurgia, escleroterapia até administração de Interferon21. Na ausência de transtornos, a proservação é a melhor conduta9.
Por sua importância clínica, por ser comum e estar presente nas áreas de atuação do cirurgião-dentista, o conhecimento dessa malformação ou neoplasia benigna é de grande interesse.

CASO CLÍNICO
Paciente MAA, leucoderma, sexo feminino, 61 anos, viúva, dona de casa apresentou-se à Clínica de Semiologia Odontológica II da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Juiz de Fora, com a queixa principal de um dente incluso: o canino superior direito.
Durante a anamnese, a paciente relatou hábitos parafuncionais como mordida de lábio inferior e rangimento dos dentes (Figura 1). Ainda no interrogatório, a mesma informou não ser portadora de nenhuma alteração sistêmica, declarou ser emotiva e ansiosa, e que fumava a cerca de 40 anos.


Após exame clínico, foram observadas cáries nos elemento 22, 37 e 47, presença de resto radicular do elemento 36, inclusão do elemento 13 na região de pré-maxila e no elemento 11 havia um acesso endodôntico, porém sem tratamento do canal. Foi observada também, a presença de cálculo dentário generalizado e manchas do tipo pápula arroxeadas na mucosa jugal esquerda, próxima à comissura labial.
Ao exame físico intrabucal, verificou-se na mucosa jugal esquerda, próxima à rima bucal, cinco manchas de 5mm a 10mm de diâmetro, cuja coloração variava de vermelho intenso ao roxo, de acordo com a localização e a profundidade. Essa lesão apresentava-se ligeiramente elevada, circunscrita, com bordos definidos, de superfície lisa, relativamente flácida a palpação e assintomática (Figura 2).


Devido às características clínicas das manchas encontradas, chegou-se à hipótese diagnóstica de lesão de natureza vascular. Dessa forma foi aplicado o teste de vitropressão, no qual realizou-se uma compressão por uma lâmina de vidro (75mm de comprimento x 25mm de largura x 1mm de espessura). Com essa manobra, a mancha adquiriu uma coloração pálida, diminuindo de tamanho devido ao esvaziamento vascular (Figura 3). Ficou definido, assim, o diagnóstico de hemangioma.


Ao exame radiográfico, não foram detectadas anormalidades dentárias ou ósseas nas regiões próximas à lesão, salvo o elemento 13 que estava incluso na região de pré-maxila e as cáries nos elementos 22, 37, 47.
Perante a idade e ao não relato de desconforto físico e estético por parte da paciente, optou-se pela proservação clínica da mesma. Também foi feita uma conscientização com a paciente a fim de evitar traumas no local do hemangioma devido ao risco de hemorragia.
Após todo o exame clínico, o prognóstico se apresentou favorável e a paciente foi encaminhada para as clínicas multidisciplinares da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Juiz de Fora, a fim de solucionar a sua queixa principal, o elemento 13 impactado.

DISCUSSÃO
A paciente não apresentava anomalias congênitas, distúrbios endócrinos ou inflamatórios. Porém, como descrito na literatura6-7, foi identificado na paciente o hábito de morder o lábio inferior e a mucosa jugal como um possível fator etiológico de natureza física, envolvido na formação do hemangioma.
Estudos relatam que mais de 50% dos hemangiomas ocorrem na região de cabeça e pescoço, tendo predileção pelos lábios1,3,10-12. Corroborando com estes estudos, o caso aqui relatado apresentou uma lesão localizada na região de cabeça e pescoço, embora o local atingido tenha sido a mucosa jugal e não o lábio, comumente relatado como a região mais prevalente.
O caso apresentado ratifica o estudo de Castro2, que relatou a possibilidade de ocorrência do hemangioma em qualquer idade, inclusive com frequência bastante considerável em idosos, na forma de hemangiomatose senil. Também está de acordo com Chinen et al.8, que escreveu sobre a alta prevalência dessa formação no sexo feminino.
Ao ser questionada sobre as manchas, a paciente relatou que nunca havia percebido a existência de tais alterações. Portanto, a história evolutiva da lesão não pôde ser descrita.
Assim como relatado por Regezi & Sciubba3, a lesão se apresentava como uma mancha de coloração que variava de vermelho intenso ao roxo, de acordo com a localização e a profundidade no tecido.
Enquadrando nas características descritas por Rocha et al.9, a paciente apresentava uma lesão relativamente flácida à palpação, circunscrita, com bordos definidos, de superfície lisa e assintomática.
A localização da lesão na mucosa jugal possibilitou a manobra semiotécnica da vitropressão pela facilidade de manipulação. Visto que regiões como gengiva e palato dificultam esta técnica e podem induzir a procedimentos com resultados indesejáveis, entre eles a hemorragia, que pode constituir risco para o paciente.
Após a vitropressão, foi constatada a coloração pálida e uma diminuição do tamanho da lesão devido ao esvaziamento vascular, assim como preconiza Rocha et al.9. Foi estabelecido assim, um diagnóstico simples, seguro e conclusivo14.
A decisão pela proservação do hemangioma no caso relatado nesse artigo está de acordo com pesquisas feitas por Rocha et al.9, o qual defendeu a adoção dessa conduta na ausência de transtornos relacionados à lesão.

CONCLUSÃO
Após a revisão literária, nota-se a presença de características clássicas no caso clínico relatado. Tais características envolvem a localização, o aspecto clínico, o fator traumático como causa principal e a maior prevalência em mulheres.
A partir das características presentes na paciente, pode-se notar a importância da vitropressão no diagnóstico diferencial das lesões de natureza vascular, mucoceles e hemangioma. Dessa forma, foi estabelecido um diagnóstico simples, seguro e conclusivo.
Quando o hemagioma não prejudicar a estética ou a função dos órgãos, é indicado a proservação do paciente, junto com uma conscientização, a fim de evitar traumas locais acompanhados de hemorragias.
Colaboradores
FLG CRUZ, RF CARVALHO e MF CARVALHO assistiram ao paciente relatado e participaram da redação do artigo em todas as suas fases. LAR SALES auxiliou no fechamento do diagnóstico do paciente e na redação do artigo em todas as suas fases. KL DEVITO participou da redação do artigo em todas as suas fases.


REFERÊNCIAS
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Recebido em: 30/7/2008
Versão final reapresentada em: 14/11/2008
Aprovado em: 25/4/2009



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Consultório odontológico na escola: análise da saúde gengival e do nível de higiene oral

RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 no.1 Porto Alegre jan./mar. 2011

 

ORIGINAL ORIGINAL



Dental office in schools: analysis of the students' gingival health and oral hygiene




Renata Almeida ChavesI,*; Anagélica Madeiro NevesII; Kênia Cristina de Oliveira MirandaI; Isabela Albuquerque PassosIII; Andressa Feitosa Bezerra de OliveiraIV
IUniversidade Federal da Paraíba, Faculdade de Odontologia. Cidade Universitária, 58051-900, João Pessoa, PB, Brasil
IIFaculdade Integrada de Patos, Curso de Odontologia. Patos, PB, Brasil
IIIUniversidade Federal da Paraíba, Faculdade de Odontologia, Departamento de Odontologia Restauradora. João Pessoa, PB, Brasil
IVUniversidade Federal da Paraíba, Faculdade de Odontologia, Departamento de Morfologia. João Pessoa, PB, Brasil






RESUMO
OBJETIVO: Realizar um levantamento das condições de saúde gengival e higiene oral de crianças de duas escolas da rede pública de ensino, em João Pessoa, Brasil, diferenciadas pela presença (escola A) e ausência de consultório odontológico (escola B) em suas dependências, além de correlacionar essas condições a escolaridade dos pais e a renda familiar.
MÉTODOS: A amostra foi composta por 170 alunos. Os índices utilizados foram: Índice de Sangramento Gengival, Índice de Placa Visível e Índice de Higiene Oral Simplificado. O nível socioeconômico foi determinado pela renda per capita. Foram aplicados o teste de qui-quadrado, Mann-Whitney U e correlação de Pearson (p<0,05).
RESULTADOS: A prevalência de gengivite foi de 81,8%. Correlação estatisticamente significativa (p<0,01) foi identificada entre os três índices dos indivíduos das escolas A e B. Não houve diferença estatisticamente significativa em relação à presença de biofilme visível entre as duas escolas. Observaram-se associações entre a gengivite das crianças e a escolaridade dos pais (p< 0,05). A diferença entre renda familiar e as escolas A e B foi estatisticamente significativa, tendo 78,2% das famílias abaixo ou na linha de pobreza.
CONCLUSÃO: Pode-se concluir que a presença de consultório odontológico na escola não foi fator determinante para a presença de melhores condições de saúde oral.
Termos de indexação: Classe social. Gengivite. Índice periodontal. Saúde Pública.

ABSTRACT
OBJECTIVE: This study investigated the gingival health and oral hygiene of students from two public schools in João Pessoa, Brazil, one with a dental office in the premises (school A) and one without (school B) and correlated these conditions with the students' parents' education level and family income.
METHODS: The sample consisted of 170 students. The indices used were: Gingival Bleeding Index, Visible Plaque Index and Simplified Oral Hygiene Index. The socioeconomic status was determined by per capita income. The chi-square test, Mann-Whitney U test and Pearson's correlation were used (p<0.05).
RESULTS: The prevalence of gingivitis was 81.8%. A significant correlation (p <0.01) was found among the three indices of the students from both schools. There was no significant difference between the students of the two schools regarding the presence of a visible biofilm. Associations were found between students' gingivitis and parents' education level (p<0.05). The family income of students from schools A and B was significantly different, with 78.2% of the households of school A/B students being at or below the poverty line.
CONCLUSION: The presence of a dental office in the school was not a determinant for better oral health conditions.
Indexing terms: Social class. Gingivitis. Periodontal index. Public health.



INTRODUÇÃO
As doenças periodontais podem ser consideradas um problema de saúde pública, pois sua prevalência é alta, principalmente nos países em desenvolvimento1. Na população, as crianças representam um grupo favorável para o desenvolvimento de gengivite devido à falta de maturidade para compreender a importância do auto-cuidado2-3. Entretanto, crianças na faixa etária de 7 a 12 anos são mais susceptíveis a aquisição de novos conhecimentos e possuem maior facilidade de aprendizado e melhor coordenação motora, podendo, assim, proporcionar resultados mais satisfatórios4. As pesquisas epidemiológicas de prevalência de doenças e condições bucais são imprescindíveis para subsidiar o planejamento de políticas preventivas e assistenciais de saúde oral5.
O consultório odontológico na escola representa, aparentemente, um importante instrumento ao alcance da população de 7 a 12 para o planejamento e execução de estratégias de promoção e prevenção de saúde, principalmente quando se refere a crianças economicamente desfavorecidas. A facilidade no acesso a tratamentos curativos e de orientação educativa, por profissional habilitado, torna o ambiente diferenciado daqueles que não o possuem.
O diagnóstico e tratamento precoce da gengivite são de fundamental importância para impedir o desenvolvimento de um quadro de periodontite. Como os indicadores socioeconômicos e os hábitos de higiene oral parecem influenciar na condição gengival, justifica-se realizar um levantamento das condições de saúde gengival de escolares pertencentes a escolas da rede pública diferenciadas pela presença de consultório odontológico em suas dependências.

MÉTODOS
Participantes
O presente estudo teve como participantes 170 alunos de 7 a 12 anos, sendo 85, de uma escola com consultório odontológico nas suas dependências (Escola A), e os outros 85, de outra escola sem consultório odontológico (Escola B).
A pesquisa foi realizada em duas instituições de ensino público da cidade de João Pessoa, capital da Paraíba. O critério de seleção da escola B restringiu-se a proximidade geográfica com a escola A, na área de abrangência da mesma Unidade de Saúde da Família.
O estudo teve caráter censitário na escola A, assim não foi realizado cálculo amostral nessa escola em virtude do pequeno número de alunos. Os alunos da escola B foram selecionados de forma randomizada, respeitando a proporção de 1:1, obtendo-se um número de participantes representativo para o que foi proposto nesse estudo.
Coleta dos dados
Os dados foram obtidos por meio de questionário padronizado para o estudo, distribuídos aos pais, contendo: dados sócio-demográficos, nível educacional dos responsáveis, renda familiar, número de pessoas residentes na casa (para determinação da renda familiar per capita) e hábitos de higiene oral da criança.
Os exames clínicos e a aplicação do questionário foram realizados apenas após a autorização dos pais pela assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
O exame clínico foi conduzido no ambiente escolar, com boa iluminação natural, utilizando-se odontoscópio e sonda periodontal. Os escolares foram examinados deitados em carteiras escolares, com a seguinte sistemática: verificação da presença e distribuição do Índice de Placa Visível (IPV), sendo excluídos os dentes em processo de erupção e com coroas parcialmente destruídas; aferição do Índice de Sangramento Gengival (ISG); e aferição do Índice de Higiene Oral Simplificado (IHO-S), proposto por Ainamo & Bay6.
O valor do índice de placa visível foi obtido em porcentagem, somando-se o número de superfícies com biofilme visível, dividindo-se pelo total de superfícies examinadas e multiplicadas por cem6.
Em seguida, foi realizada a avaliação da presença ou ausência da gengivite (ISG) por meio do sangramento, após sondagem suave do sulco gengival, em todos os dentes, nos quatro sítios de sondagem (vestibular, lingual/palatino, mesial e distal). Os dados obtidos foram transcritos para uma ficha clínica padronizada para cálculo e interpretação dos escores dos índices analisados7.
A severidade da gengivite foi baseada na classificação de Coutinho & Tostes Amaral8 que consideram a quantidade de superfícies gengivais sangrantes para determinar a severidade da doença gengival. Quando houve ausência dessas superfícies considerou-se a gengivite como ausente. A gengivite foi suave quando o índice de sangramento gengival variou de 1 a 15 superfícies sangrantes; moderada, com o índice de sangramento gengival de 16 a 35 superfícies; e severa, quando o índice de sangramento gengival foi igual ou acima de 36 superfícies. O índice de sangramento gengival (%) foi obtido pela soma do número de superfícies sangrantes, dividindo-se pelo total de superfícies examinadas multiplicado por cem9.
Os critérios de interpretação dos escores obtidos pelo indice de higiene oral foram elaborados a partir da soma dos valores atribuídos para cada superfície corada, dividido pelo número de dentes examinados. A higiene oral foi classificada em satisfatória, regular e deficiente a partir da média do índice de higiene oral: 0 a 1: higiene oral satisfatória; 1,1 a 3 insatisfatória. É válido ressaltar que na avaliação das condições de higiene oral dos participantes da pesquisa, o índice de higiene oral simplificado foi considerado o indicador padrão de higiene oral no momento da observação.
A renda per capita familiar foi obtida pela divisão da renda familiar mensal pelo número de integrantes da família, sendo considerada linha de pobreza o valor final menor que R$175,00, de acordo com O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento10.
O exame oral foi realizado por uma única pesquisadora, devidamente calibrada. O teste Kappa foi utilizado, com o reexame de 10% das crianças do total de participantes, obtendo-se valores de concordância intra-examinador do índice de sangramento gengival e índice de placa visível de 0,82 e 0,78, respectivamente, com intervalo de sete dias entre os exames.
Para análise dos dados foi utilizado o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 13.0. Foram realizados os testes qui-quadrado, Mann-Whitney U e a correlação de Pearson. O nível de significância considerado foi de 5% e os dados foram apresentados em valores absolutos e percentuais.
Os procedimentos para a realização desta pesquisa respeitaram as diretrizes e normas que regulamentam as pesquisas envolvendo seres humanos, aprovadas pela Resolução número 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde. Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba, sob protocolo nº 373.

RESULTADOS
No geral, a prevalência de gengivite foi de 81,8% (n=139). Quando distribuído pelos grupos A (escola com consultório) e B (escola sem consultório), os alunos da
escola A apresentaram a maior prevalência de gengivite (57,6%) e nível de higiene oral insatisfatório (54,4%), respectivamente, p<0,001 e p=0,006. Em relação à presença de biofilme visível, não foi observada diferença estatisticamente significativa entre as duas escolas (Tabela 1).


As médias de superfícies sangrantes (ISG), bio-filme visível (IPV) e Índice de Higiene oral Simplificado (IHO-S) foram de 10,16% (IC de 8,49−11,82), 10,47% (IC de 8,79−12,14) e 2,18% (IC de 2,0−2,3), respectivamente. Os índices de placa visível e higiene oral simplificado foram correlacionados ao índice de sangramento gengival, observando-se uma correlação estatisticamente significativa (p<0,01) entre o índice de sangramento gengival - índice de placa visível e índice de sangramento gengival - índice de higiene oral simplificado na escola A (r=0,42; r= 0,28, respectivamente); e entre ISG - índices de placa visível e índice de sangramento gengival - índice de higiene oral simplificado na escola B (r= 0,46; r= 0,30, respectivamente).
No geral, observaram-se associações entre a gengivite das crianças e a escolaridade dos pais (χ2= 9,1; gl= 2; p< 0,05), com nível educacional até o ensino fundamental (Tabela 2).


Cento e trinta e três alunos encontravam-se abai-xo ou na linha de pobreza, sendo que a escola A estava com 57,1% (n= 76) desses alunos. A diferença entre renda familiar e as escolas A e B foi estatisticamente significativa (Tabela 3).


Todos os alunos da escola A apresentaram baixo nível socioeconômico, enquanto na escola B, 13 (15,3%) escolares eram do nível mais alto. Entre esses, a prevalência de gengivite foi de 84,6% (n= 11), o biofilme visível foi identificado em 92,3% (n= 12) e a condição de higiene oral satisfatória foi identificada em apenas 2 (15,4 %) escolares.
Na distribuição do Índice de Sangramento Gengival (Figura 1), observou-se tendência a maior percentual de superfícies sangrantes em alunos da escola A (p<0,001).


Em relação aos hábitos de higiene, não foi observado diferença estatisticamente significativa entre escovação de dentes e uso de fio dental entre as duas escolas (p<0,05).

DISCUSSÃO
Esse trabalho contribui para uma discussão sobre a importância do consultório odontológico no ambiente escolar tendo relevância pela possibilidade da implantação de ações de promoção e prevenção à saúde oral na população envolvida neste estudo.
A doença periodontal tem a gengivite como a sua manifestação mais prevalente. No Brasil, a média de prevalência de gengivite, em crianças de 7 a 12 anos de idade, é de 90%11. Observou-se uma elevada prevalência de gengivite na população examinada (81,8%) corroborando achados de estudos anteriores12-15, discordando apenas o realizado por Zebulum & Cunha16 no qual a prevalência foi de apenas 30,32%.
A alta prevalência do biofilme dental visível (94,7%) foi similar aos achados de Cardoso et al.9, Araújo & Gusmão12 e Cunha & Chambrone17. Em relação às três condições avaliadas (gengivite, biofilme visível e higiene oral), o biofilme visível foi o único que não apresentou diferença significativa entre os alunos das duas escolas. Este fato demonstra que apesar da facilidade de acesso a orientações educativas no ambiente escolar, existe a necessidade de planejamento para implantação de estratégias preventivas mais eficazes. Sendo interessante a intervenção motora por ser mais eficiente na melhora do padrão de higiene do que as instruções educacionais teóricas isoladas3.
É válido ressaltar que as crianças de ambas as escolas não possuem atividades educativas e preventivas voltadas para saúde bucal previstas no currículo escolar. Assim, instiga-se a necessidade de inserir orientações educativas no conteúdo programático de ambas as escolas, considerando que mesmo sem a presença de consultório odontológico (caso da escola B), ações educativas e preventivas voltadas para melhoria da saúde oral podem/ devem ser desenvolvidas.
Como evidenciado na literatura a respeito de estudantes de escolas públicas, a maioria apresentou baixa renda familiar per capita18. Entretanto, observou-se que os alunos da escola com consultório odontológico apresentaram condições financeiras significativamente desfavoráveis quando comparados aos estudantes da outra escola, apesar de ambas serem da rede pública de ensino e apresentarem proximidade na área geográfica. Além disso, os alunos também tinham as piores condições de saúde gengival e higiene oral, confirmando a carência e a real necessidade da presença do consultório odontológico com realização de ações de promoção de saúde oral mais direcionada a realidade em que se encontram.
O menor poder aquisitivo envolve diversos fatores que possibilitam a aquisição de doenças, como, por exemplo, a cárie e as doenças periodontais. Esses fatores dizem respeito ao estilo de vida, moradia e acesso a produtos, condições de higiene oral, acesso a serviços de saúde, nível educacional entre outros18-19. Nesse sentido, Feldens et al.20 observaram maior prevalência de gengivite entre indivíduos de baixo nível socioeconômico.
Foi observada uma associação entre a gengivite e a escolaridade dos pais, considerando a maior manifestação da gengivite em indivíduos cujos pais não atingiram o ensino médio5. Este achado é importante por remeter à falta de conhecimento dos pais com a pouca importância dada à saúde oral. Muitas vezes é difícil pensar que os pais deveriam dar importância à higiene oral quando não tem o alimento mínimo e necessário para a sua sobrevivência. Instigando que não basta ter um consultório odontológico nas dependências da escola, é necessário que haja um programa educativo-preventivo, pois, quanto bem executado, é de grande importância na redução e controle do índice de sangramento gengival e biofilme dental, sendo mais efetivo, de acordo com estudos, o acompanhamento continuado17.
As informações desse estudo podem ser projetadas, cautelosamente, para outros cenários com escolares de baixo nível socioeconômico, que necessitam de atenção a saúde oral advinda de instituições públicas. Esse trabalho evidencia que muitas crianças possuem um veículo facilitador de promoção/prevenção a saúde oral (consultório odontológico) dentro da escola que está sendo subutilizado.

CONCLUSÃO
Dentro dos limites deste trabalho e com base nos resultados pode-se inferir que a prevalência de gengivite é alta nos escolares das duas instituições, sendo maior nos alunos da escola que possui consultório odontológico nas suas dependências. Porém, este fato parece estar mais relacionado com a renda familiar e o grau de escolaridade dos pais, que é maior na escola que não possui consultório odontológico.
Em relação aos hábitos de higiene não foram observados diferença estatisticamente significativa entre escovação de dentes e uso de fio dental entre os alunos das duas escolas. É de fundamental importância implementar na escola que possui consultório odontológico, um programa educativo-preventivo, como base na motivação de seus alunos em relação a sua saúde oral.
Agradecimentos
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro.
Colaboradores
RA CHAVES e AM NEVES trabalharam na elaboração do projeto, coleta e tabulação dos dados, elaboração e redação do artigo. KCO MIRANDA participou da revisão bibliográfica, análise e interpretação dos dados, organização e redação final do artigo. AFB OLIVEIRA e IA PASSOS participaram na orientação da pesquisa, concepção teórica do projeto, na orientação da discussão e na redação final do artigo.


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Recebido em: 18/7/2009
Versão final reapresentada em: 27/12/2009
Aprovado em: 10/3/2010



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Análise da relação entre a ocorrência da halitose e a presença de saburra lingual

RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 no.1 Porto Alegre jan./mar. 2011

 

ORIGINAL ORIGINAL



Analysis of the relationship between halitosis and white tongue


Joaquina Araújo de Amorim*; Ruthinéia Diógenes Alves Uchôa Lins; Alyne Dantas de Souza; Daliana Queiroga de Castro Gomes; Miliani do Amaral Souza Maciel; Renaly Nunes de Lucena
Universidade Estadual da Paraíba, Faculdade de Odontologia. Av. das Baraúnas, 351, Campus Universitário, Bodocongó, 58429-500, Campina Grande, PB, Brasil




RESUMO
OBJETIVO: Avaliar a relação etiológica entre a halitose e a presença de saburra lingual.
MÉTODO: Os métodos utilizados foram entrevistas, com preenchimento de uma ficha clínica apropriada; exame clínico (inspeção visual e sondagem periodontal) e aferição do grau de halitose, utilizando o aparelho Breath Alert. O universo desta pesquisa compreendeu os indivíduos atendidos nas clínicas integradas do Departamento de Odontologia da Universidade Estadual da Paraíba, no período destinado à coleta de dados, sendo totalizada uma amostra de 80 pacientes.
RESULTADOS: Foi constatado que 66,0% dos pacientes investigados relataram realizar higiene da língua, 32,5% relataram não higienizá-la e 1,5% afirmaram higienizá-la apenas esporadicamente. Verificou-se também que 41,7% dos investigados apresentaram odor leve no hálito e 60,0% daqueles que apresentaram odor moderado exibiram a presença de saburra lingual. No entanto, 52,4% dos pacientes classificados sem odor no hálito também apresentaram tal alteração na língua. A prevalência da halitose na população do estudo foi de apenas 21,3%, na qual 15,0% apresentaram odor leve e 6,3% odor moderado no hálito.
CONCLUSÃO: Apesar de a literatura relatar que os fatores que facilitam o acúmulo de biofilme dental na língua, resultando em saburra lingual, influenciam no desenvolvimento e na instalação da halitose, não foi verificado relação significativa, neste experimento, entre a presença de saburra lingual e a ocorrência da halitose.
Termos de indexação: Etiologia. Halitose. Língua.

ABSTRACT
OBJECTIVE: This study assessed the relationship between halitosis and white tongue.
METHODS: The patients were interviewed and a clinical form was filled out. They were also examined by visual inspection and periodontal probing. The degree of halitosis was determined by the Breath Alert device. The universe of this study consisted of individuals who visited the clinics of the State University of Paraiba Dental Department during the study period. The sample consisted of 80 patients.
RESULTS: Sixty-six percent of the patients reported cleaning their tongues, 32.5% reported never cleaning their tongues and 1.5% reported cleaning their tongues periodically. Forty-one point seven percent of the patients with mild halitosis and 60,0% of those with moderate halitosis presented white tongue. However, 52.4% of the patients without halitosis also presented white tongue. Only 21.3% of the sample presented halitosis; 15,0% had mild halitosis and 6.3% had moderate halitosis.
CONCLUSION: According to the literature, the factors that promote the accumulation of dental biofilm on the tongue, resulting in white tongue, also promote the development and establishment of halitosis. However, the present study did not find a significant relationship between white tongue and halitosis.
Indexing terms: Etiology. Halitosis. Tongue.



INTRODUÇÃO
A halitose é uma condição do hálito na qual este se altera, de forma desagradável tanto para o paciente como para as pessoas com as quais ele se relaciona, podendo ou não significar uma condição patológica. É também conhecida como hálito fétido, fedor da boca, mau hálito ou mau odor oral. Constitui uma queixa comum, de ocorrência mundial, que afeta adultos de ambos os sexos e em qualquer faixa etária, apresentando uma etiologia multifatorial, embora o seu principal fator causador seja a decomposição de matéria orgânica, provocada por bactérias anaeróbias proteolíticas da cavidade oral1-2.
Os odores bucais variam de acordo com o decorrer do dia, podendo depender do fluxo salivar, de resíduos alimentares, da população bacteriana local, da ingestão de certos medicamentos e bebidas, bem como do tabagismo e da presença de saburra lingual2.
O hálito desagradável ao acordar é considerado fisiológico, devendo ser distinguido da halitose propriamente dita. Ele acontece devido à hipoglicemia, à redução do fluxo salivar para virtualmente zero durante o sono e ao aumento da microbiota anaeróbia proteolítica. A atuação desses micro-organismos sobre os restos epiteliais descamados da mucosa bucal e as proteínas da própria saliva geram componentes de odor desagradável. Após a realização da higiene dos dentes e da língua e da primeira refeição, a halitose matinal deve desaparecer. Caso isso não ocorra, pode-se considerar o indivíduo como possível portador de halitose real, problema a ser investigado e tratado3.
As células epiteliais descamadas da mucosa oral são constituídas de proteínas ricas em aminoácidos que contém enxofre. Estes aminoácidos surgem depois da proteólise e, por um processo de redução, liberam o enxofre na forma de sulfidretos (SH2). O sulfidreto pode ser comparado ao cheiro de ovo choco juntamente com outros compostos voláteis de enxofre (metilmercaptanas e dimetilsulfeto), sendo denominados genericamente de Compostos Sulfurados Voláteis (CSV)4-5.
Diversas são as etiologias atribuídas à halitose. Em sua maioria, cerca de 90% dos casos, as alterações odoríferas são de origem estomatológica, ou seja, iniciam-se na boca, principalmente em decorrência da saburra lingual, da gengivite e da periodontite. Os fatores relacionados ao trato respiratório superior, bem como aqueles de origem intestinal e os demais respondem pelos 10% restantes6. Os fatores orais da halitose, tais como a saburra lingual e as doenças periodontais, contribuem com 90% dos casos de halitose, sendo o trato respiratório responsável por 8% da incidência e o trato gastrintestinal por apenas 1% desta7.
Muitas evidências sugerem que a doença periodontal e o acúmulo de biofilme no dorso da lingual aumentam a severidade da halitose, ainda que não possam ser considerados, exclusivamente, como causa primária do mau odor oral. A má higiene oral que, ao promover um acúmulo de biofilme dentário, constitui um fator determinante para o desenvolvimento da doença periodontal, também contribui para o acúmulo da saburra lingual, além de aumentar a disponibilidade de nutrientes para os micro-organismos envolvidos com a etiologia da halitose8.
Brening et al.9 e Massler et al.10 consideram a saburra lingual como sendo a causa primária da halitose e a destruição de tecidos, resultantes da doença periodontal ou da doença cárie, as quais também formam substratos que podem produzir odor, como causa secundária, sendo as referidas doenças ocasionadas, a princípio, por uma má higiene bucal.
Os depósitos que se acumulam no dorso da língua são denominados saburra lingual ou depósitos saburróides. O seu acúmulo também é favorecido pelas alterações morfológicas da língua, incluindo a língua geográfica, as fissuras dorsais e a altura das papilas gustativas, visto que quanto mais elevadas estas forem mais difícil torna-se a sua higienização predispondo à instalação da halitose4.
Toda condição clínica que favorece a deposição de material saburróide na língua, bem como, a localização desses depósitos em outros locais, constituem um potencial para a ocorrência de halitose, porém em virtude de variações fisiológicas e processos adaptativos, estes podem também não apresentar um grande significado na etiologia da halitose bucal4,11. A saburra lingual forma-se em indivíduos com predisposição a sua constituição. Considerando isso, o mau hálito não é obrigatoriamente contagioso, visto que muitas vezes é observado em casais que convivem intimamente com a sua presença em apenas um parceiro, gerando, usualmente incômodo ao outro12.
O tratamento da halitose por saburra lingual consiste basicamente na remoção da saburra com raspadores linguais, disponíveis em vários modelos no mercado, e na utilização de antimicrobianos direcionados especialmente às bactérias proteolíticas e também sulfurados voláteis, tais como: sulfidreto, dimetilsulfeto e metilmercaptanas. Entretanto, somente estes mecanismos podem não conseguir eliminar a halitose, sendo difícil manter essa situação. Por tal razão, é preciso atuar nas causas da formação da saburra, lembrando que esta é formada pelo aumento da concentração de mucina, células epiteliais descamadas e micro-organismos proteolíticos, incluindo as bactérias Porphyromonas gingivalis, Fusobacterium nucleatum, entre outras.
Após a constatação de que o indivíduo é portador de halitose, não se deve ignorá-lo, sendo o melhor caminho para o mesmo procurar um profissional qualificado que o auxiliará na cura desse mal. Como 90% das causas da halitose são de origem bucal, tendo dentes e gengivas envolvidos no processo, aconselha-se procurar por um cirurgião-dentista que, por meio de exames e testes, avaliará e promoverá a melhor solução para seu tratamento. Sendo detectado algum problema de competência do médico e não mais do cirurgião-dentista, o paciente deverá ser encaminhado ao especialista correspondente3.
Com base no exposto, o objetivo do presente trabalho consiste em realizar uma avaliação da presença da saburra lingual e da sua relação etiológica com a halitose.

MÉTODOS
A pesquisa realizada foi do tipo descritiva, analítica e transversal. O universo compreendeu os indivíduos atendidos nas Clínicas Integradas do Departamento de Odontologia da Universidade Estadual da Paraíba, sendo a amostra selecionada aleatoriamente, de acordo com a demanda espontânea dos usuários nos dias de atendimento. O trabalho foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba, sendo aprovado com o número CAAE 151/03, de acordo com os preceitos da resolução 196/96. Durante a fase de coleta de dados, compreendida entre os meses de outubro de 2003 a maio de 2004, foram investigados 80 pacientes, com idade variável entre 15 e 67 anos. Os indivíduos concordaram em participar da pesquisa, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, propondo-se a responder as questões da ficha e a submeter-se aos exames clínicos bem como à aferição do hálito.
Foram excluídos desta pesquisa, indivíduos com idade inferir a 15 anos, visto que usualmente estes apresentam um comportamento diferenciado quanto ao hábito de higiene bucal, não apresentam tanta influência hormonal, sendo esta iniciada exatamente por volta dos 15 anos, o que justifica, em parte, uma maior predisposição para ocorrência de gengivite, por conseguinte, uma microbiota também diferenciada.
Os instrumentos de diagnóstico utilizados para a coleta de dados foram: o aparelho aferidor de hálito portátil (Breath Alert); um exame clínico apropriado através de inspeção visual e uma entrevista com o preenchimento de uma ficha clínica específica, contendo informações referentes ao exame clínico, à auto percepção da halitose, à presença de hábitos e à identificação do paciente, respeitando as normais vigentes no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba.
Os dados coletados foram codificados, agrupados e processados, aplicando-se para análise: o tratamento estatístico descritivo e analítico. Foram utilizados o Programa Estatístico SPSS 11.05 (Statistical Package for Social Science - for Windows) e a Planilha eletrônica Excel, sendo os resultados apresentados sob a forma de Figuras e Tabelas.

RESULTADOS
Ao final da pesquisa, foi contabilizada uma amostra de 80 indivíduos investigados, perfazendo um total de 100% da amostra (Tabela 1), segundo o hábito de higienizar a língua. Constatou-se que 66,0% dos pacientes investigados relataram realizar higiene da língua com a própria escova ou raspadores linguais, 32,5% relataram não higienizar à língua e 1,5% afirmaram higienizá-la apenas às vezes


Verificou-se que a maioria destes (52,5%) não apresentou saburra lingual no momento do exame clínico, enquanto 47,5% dos investigados apresentaram a referida alteração (Tabela 2).


A Figura 1 revela a distribuição percentual dos pacientes investigados, segundo o nível de hálito aferido, sendo este classificado em N1 (sem odor), N2 (odor leve), N3 (odor moderado) e N4 (odor forte). Constatou-se, por meio da aferição com o aparelho Breath Alert, que 78,7% dos pacientes investigados não apresentaram alterações no hálito (N1), os quais foram considerados portadores de hálito sem odor, e 21,3% apresentaram alguma forma de alteração no hálito. Dos indivíduos que exibiram halitose, 15% apresentaram odor leve (N2) e 6,3% odor moderado (N3). Nenhum dos entrevistados apresentou odor forte, ou seja, N4.


A Figura 2 demonstra a distribuição percentual dos pacientes investigados, segundo o nível de hálito aferido e o hábito de higienizar a língua. Verificou-se que 32,5% dos indivíduos que afirmaram não higienizar a língua apresentaram hálito sem odor. Entretanto 75% e 80% dos indivíduos que afirmaram escovar a língua apresentaram, respectivamente, odor leve e odor moderado no hálito.


A Figura 3 exibe a distribuição percentual dos investigados segundo o nível de hálito aferido e a presença ou não de saburra lingual. Constatou-se que 41,7% dos investigados que apresentaram odor leve e 60,0% daqueles que apresentaram odor moderado no hálito, demonstraram a presença de saburra lingual, entretanto 52,4% dos pacientes classificados sem odor no hálito também apresentaram saburra lingual.


DISCUSSÃO
De conformidade com Uliana & Briques13, os odores bucais frequentemente variam durante o dia de acordo com a hora, a depender, em grande parte, da quantidade do fluxo salivar, da presença de resíduos alimentares, da população local de bactérias, da ingestão de determinadas drogas e bebidas, além do hábito de fumar e da presença de saburra lingual. Entretanto, o odor é mais intenso quando o indivíduo acorda pela manhã, diminuindo a sua intensidade após a higiene bucal. Complementando, Tenório Sobrinho & Azevedo14 afirmaram que, se considerarmos o hálito desagradável ao acordar como uma halitose real, praticamente 100% da população é portadora de halitose. Por esse motivo, o hálito da manhã é considerado fisiológico. Para esses autores, após a higiene dos dentes e da língua bem como após a primeira refeição, caso a halitose matinal não desapareça, é que se pode considerar o indivíduo portador de halitose, precisando este ser investigado e tratado.
As últimas pesquisas realizadas no Centro de Halitose da Universidade da Califórnia mostraram que 60% da população americana são portadores de halitose crônica, como a halitose matinal. No Brasil, segundo a Associação Brasileira de Estudos e Pesquisa dos Odores da Boca, mais de 40% da população brasileira sofre de halitose. A primeira pesquisa a respeito da prevalência de halitose no País indica que há 17% de incidência dessa alteração odorífera na faixa etária compreendida entre 0 e 12 anos, 41% na faixa etária de 12 a 65 anos e 71% na faixa acima de 65 anos. De acordo com os registros encontrados no mundo, percebe-se que a ocorrência de halitose tem se apresentado de forma crescente. Esses dados evidenciam um aumento significativo do número de portadores de halitose, podendo isso tornar-se um fato preocupante, uma vez que, de acordo com os resultados encontrados no trabalho de Kolbe6, alguns fatores predisponentes à halitose também podem estar associados ao estresse emocional e às mudanças nos hábitos alimentares que, segundo o referido autor, representam as duas maiores causas do crescimento da halitose.
Na presente pesquisa, verificou-se que 32,5% dos indivíduos que afirmaram não higienizar a língua exibiram um hálito sem odor, enquanto 75,0% e 80,0% dos indivíduos que relataram escovar a língua apresentaram, respectivamente, odor leve e odor moderado no hálito, resultados esses que discordam de Yaegaki & Sanada15, Bosy16 e Rendeiro et al.17, os quais apontaram a saburra lingual como sendo a principal fonte do mau odor bucal, preconizando a higienização da língua como uma recomendação extremamente importante para a redução da probabilidade da ocorrência de halitose, o que não se pode afirmar com exatidão, pois a presença de depósitos saburróides não é determinante para o aparecimento de halitose, mas sim um fator predisponente, ao surgimento dessa alteração odorífera.
Em concordância com os resultados encontrados neste estudo, no qual não foi observada uma relação significativa entre a ocorrência de halitose e a presença de saburra lingual, Peruzzo et al.18, ao coletar a saburra lingual de um grupo de indivíduos e pedir-lhes para não realizarem a higiene da língua durante 30 dias, também não encontraram uma diferença significativa no tocante à presença de saburra lingual após o referido período (sem higiene), afirmando, portanto, que não parece existir relação alguma entre a saburra e a halitose. Isso pode ser justificado, possivelmente, pelo fato de a etiologia da halitose estar mais intimamente associada a outros fatores causais, diferentes da saburra lingual, dentro os quais merecem destaque as alterações periodontais de natureza inflamatória desencadeados pelo acúmulo de biofilme dental nos dentes e na gengiva.
Segundo Ratcliff & Johnson19, os compostos sulfurados voláteis são gases responsáveis pelo mau hálito e os dois principais representantes do grupo são o sulfeto de hidrogênio (H2S) e a metilmercaptana (CH3SH), produzidos principalmente, pelos patógenos periodontais presentes na saburra lingual, os quais promovem certos efeitos citotóxicos sobre a fisiologia celular incluindo a liberação de odores. Os autores sugerem ainda que o CH3SH, em contato com a mucosa, pode estimular a produção de citocinas associadas à doença periodontal. Corroborando com a citação anterior, Kolbe6 e Scully et al.20 observaram, em seus estudos, que os compostos sulfurados voláteis são os principais compostos causadores do mau hálito, sendo produzido por bactérias gram-negativas, encontradas principalmente no dorso da língua e nas bolsas periodontais, como os Porphyromonas, o fusobactérium e a prevotella. Além desse aspecto, Miyaki et al.21 avaliaram, utulizando um monitor portátil, o mau odor bucal em 2.672 indivíduos, observando uma relação significativa entre os compostos sulfurados voláteis e a saburra lingual. Nesse sentido De Boever & Loesche22, ao examinarem 16 pessoas que se queixavam de halitose, demonstraram que o mau odor bucal estava relacionado não apenas com a presença como também com a quantidade de saburra lingual.
Na presente pesquisa, verificou-se também que 41,7% dos investigados que apresentaram odor leve e 60,0% daqueles que exibiram odor moderado no hálito demonstraram a presença de saburra lingual, associando-se assim a interferência desse fator na etiologia da halitose. Contudo, é importante salientar que 52,4% dos indivíduos classificados como sem odor bucal também apresentaram saburra lingual, resultado este que discorda da maioria dos autores citados na literatura, que acreditam na forte relação etiológica existente entre a halitose e presença da saburra lingual, incluindo o estudo de Kolbe6, que destaca a grande importância da eliminação da saburra lingual, tendo em vista o fato de esta representar o agente etiológico responsável por aproximadamente 90,0% dos casos de halitose.
A maioria dos autores mencionados no presente trabalho concorda que o dorso da língua e as bolsas periodontais representam os principais locais de proliferação de bactéria anaeróbias relacionadas com a produção de compostos sulfurados voláteis. Acrescentando, Kolbe6 descreve ainda em seus relatos que o crescimento das bactérias anaeróbias ocorre, principalmente, nas fissuras encontradas na língua e sob o tecido gengival. Em contrapartida, segundo Willis et al.23, as bactérias redutoras de enxofre e produtos sulfídricos não são os principais agentes causadores de halitose, responsabilizando sim a doença periodontal como o fator etiológico principal.
Depreende-se das declarações de Tárzia12, no que diz respeito à etiologia da halitose, que a saburra lingual supera a doença periodontal em grau de importância, uma vez que esta última é frequentemente encontrada em pacientes com e sem doença periodontal, estando, no entanto, associada à presença de saburra lingual, ao passo em que, dificilmente, está presente em pacientes com doença periodontal e ausência de saburra lingual. Em discordância, De Boever & Loesch22 revelam que a microbiota da saburra lingual é bastante semelhante a da doença periodontal e, portanto, 100% dos pacientes com doença periodontal também apresentam saburra lingual, não sendo possível assim distinguir qual desses dois fatores (doença periodontal e saburra lingual) representam, de fato, o principal agente etiológico da halitose.
As observações anteriormente mencionadas induzem à assertividade de que os micro-organismos envolvidos com a doença periodontal atingem o periodonto, instalando-se inicialmente, no dorso da língua. Por esta razão é que existe uma sequência lógica de eventos e uma forte atribuição de relevância à saburra lingual como agente causador da halitose, corroborando com a afirmação de que a superfície dorsal da língua é a fonte primária de putrefação microbiana da boca, segundo relatos de Kolbe6.
De acordo com os resultados encontrados em grande parte dos experimentos pesquisados na literatura, observou-se que, geralmente, existe uma maior quantidade de saburra lingual em pacientes com periodontite crônica. Yaegaki & Sanada15, ao coletarem saburra lingual de pacientes com e sem doença periodontal, obtendo o peso úmido da saburra, verificaram que os pacientes periodontalmente comprometidos apresentavam uma maior quantidade de saburra do que os pacientes considerados periodontalmente saudáveis. Além disso, Miyaki et al.21, ao avaliarem o mau odor em 2.672 indivíduos, encontraram uma forte relação entre os compostos sulfurados voláteis e o volume da saburra lingual. Com base nesses resultados, os referidos autores propuseram que o mau odor bucal era causado, principalmente, pelo acúmulo de saburra nos indivíduos jovens e, nos indivíduos com idade mais avançada, tanto a saburra como a doença periodontal, representavam fontes causadoras de halitose.
Observa-se, ainda, que a produção de compostos sulfurados voláteis pelos pacientes periodontalmente comprometidos era quatro vezes maior do que aquela realizada pelo grupo classificado como periodontalmente saudável.
Embora possa representar o primeiro sinal de uma doença grave, um diagnóstico bem estruturado e atento permite encontrar, para a maioria dos casos, uma causa simples e de fácil tratamento. Frequentemente, o cirurgião-dentista detém um papel chave no descobrimento do fator etiológico de diversas alterações, inclusive da halitose, podendo ser confirmada a sua multidisciplinaridade, conforme revelam Meningaud et al.24. Sendo assim, em virtude das várias etiologias atribuídas à halitose, diversos exames podem ser utilizados para medir a extensão do problema, tais como: a sialometria, para medição do fluxo salivar; a avaliação através do Halímetro, para medição da quantidade de compostos sulfurados voláteis presentes no hálito; e, por fim, a mensuração da quantidade de saburra lingual.
Multíplos investigadores citados na literatura, dentre eles Tárzia2, Goldberg et al.25, Lee et al.26 e Cortelli et al.27, são unânimes em afirmar que o tratamento da halitose varia de acordo com a sua causa, a depender também de um diagnóstico correto, sendo preciso tratar, em especial, a origem do problema e não somente o seu efeito.

CONCLUSÃO
Embora a literatura consultada revele que os fatores que favorecem o acúmulo de biofilme no dorso da língua, resultando no desenvolvimento da saburra lingual, usualmente influenciam na instalação de halitose, baseado nos resultados encontrados no presente estudo, parece não estar tão evidente a estreita relação etiológica divulgada entre a presença de saburra lingual e a ocorrência da halitose, visto que outros fatores também podem estar associados à etiologia desta alteração odorífera, merecendo destaque, dentre eles, a doença periodontal.
Colaboradores
JA AMORIM e RDAU LINS participaram da orientação da pesquisa. AD SOUZA participou da elaboração e execução do projeto de pesquisa. DQC GOMES colaborou na interpretação dos dados. MAS MACIEL e RN LUCENA colaboraram com a elaboração do corpo do texto e adequação as normas da revista. Todos colaboraram na revisão final do texto.


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Recebido em: 30/1/2009
Versão final reapresentada em: 9/4/2009
Aprovado em: 30/6/2009




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